SBD-GO
NOTÍCIA
28
Dec
A percepção de uma
crescente procura nos consultórios para correções de problemas, que vão desde
assimetria até cegueira, motivou o estudo.
Uma pesquisa
brasileira feita com 160 médicos dermatologistas, publicada este ano, mapeou a
incidência e as causas de complicações nos preenchimentos faciais no Brasil. A
percepção de uma crescente procura nos consultórios para correções de
problemas, que vão desde assimetria até cegueira, motivou o estudo.
O levantamento,
feito em 2021, levou em consideração os registros médicos enviados pelos
participantes de 19 estados. Foram solicitados via questionários o número de
procedimentos realizados, os tipos de produtos e o detalhamento das
complicações atendidas no ano anterior.
Ao todo, foram
avaliados 47.360 procedimentos do tipo, dos quais 1.032 tiveram complicações
(média de 6,45 por ano), sendo mais da metade deles, 550, ocasionados em
procedimentos feitos por não médicos.
Apesar da fraca correlação entre o número total e as
complicações (cerca de 2,2%), a proporção de danos em casos tratados por não
médicos preocupa os pesquisadores, bem como o uso incorreto dos produtos.
A média de procedimentos de cada dermatologista foi de 7,4
por semana, e os agravamentos decorrentes de procedimentos dos próprios
entrevistados representaram um índice de 1,23 ao ano. Já pacientes atendidos
por outros tipos de médicos tiveram uma taxa de lesão de 1,79 por ano, e os
atendidos por outros tipos de profissionais não médicos chegaram a ter 3,43 por
ano.
Excesso de produto e falta de técnica estão entre as causas
mais comuns das queixas, sendo as principais complicações relatadas após um mês
ou mais do procedimento. Os resultados foram publicadosno artigo
"Frequency of Complications of Aesthetic Facial Fillers in Brazil"
(frequência de complicações dos preenchimentos faciais estéticos no Brasil), na
Revista de Cirurgia Plástica e Reconstrutiva da Sociedade Americana de
Cirurgiões Plásticos.
Os autores Mayra Ianhez e Marcela Souza, da UFG
(Universidade Federal de Goiás), e Hélio Miot, da Unesp (Universidade Estadual
Paulista), estudaram, além da frequência das complicações, as características
de produtos e as técnicas de injeção.
"A questão que nos despertou a curiosidade foi: será
que as complicações estão mais frequentes unicamente por que tem mais pessoas
fazendo, ou isso está ligado a profissionais com uma habilitação
reduzida?", conta Miot, que é professor do departamento de dermatologia da
Unesp.
Uma segunda hipótese avaliada foi a do tipo de
preenchimento. "Uma coisa é fazer um que corrija uma ruga pequena, outra é
fazer a chamada volumização", diz Miot.
O professor afirma que grande parte das complicações
aconteceu pelo volume de produto, o que reforça a tese de que uma correção mais
natural, sem injeção excessiva em locais como bochechas, queixos e lábios, é
mais indicada.
"Maior o volume de produto, maior o risco de infecção,
maior o risco de reação tecidual, [porque] fica mais tempo no tecido,
provocando reações de hipersensibilidade local."
Outro problema é a regulação de produção e venda. Diferente
da toxina botulínica, os preenchedores e os bioestimuladores usados nas
chamadas "harmonizações faciais" não são considerados medicações do
ponto de vista regulamentar.
"Você não tem que provar a eficácia e segurança igual
ao medicamento. Se eu lançar uma dipirona, tenho que provar a bioequivalência
do meu com o de referência no mercado. Se eu lançar um ácido hialurônico,
não", alerta Miot.
Segundo o professor, apesar de haver controle de qualidade
durante a produção, para o ácido hialurônico, o ácido polilático e a
hidroxiapatita de cálcio, as três substâncias básicas avaliadas na pesquisa,
não há uma vigilância de efeitos adversos e de segurança.
As principais complicações relatadas foram nódulos (63% da
amostra), edema (inchaço) persistente ou intermitente (62%) e infecção tardia
(25%). Em menor amplitude, houve oclusão arterial (15%), que leva a necrose, e
ulceração da pele (8%).
A pesquisadora Ianhez, que é chefe da cosmiatria da UFG e
médica do Hospital de Doenças Tropicais, aponta ainda que, embora efeitos
adversos ocorram com todos os tipos de produtos, a incidência varia entre as
marcas.
Assim, foram tabeladas as taxas de complicações de marcas
específicas, mas os pesquisadores afirmam, no entanto, que para cada uma delas
é necessário um estudo direcionado, principalmente quanto à tecnologia de cada
fabricante. Para entender melhor os casos, a sensibilidade dos pacientes também
deve ser avaliada em uma nova pesquisa em curso.
"Provavelmente, os pacientes que tenham mais
autoimunidade, ou seja, que tenham mais doenças de reatividade, doenças
reumatológicas, reagem mais a esses corpos e produtos estranhos", diz
Miot.
Também está sendo avaliado se a presença de um produto como
o ácido hialurônico após uma infecção viral pode ser um indutor de reação e de
inchaço. "Isso é bastante comum e mostra que o produto não é completamente
inerte, ele é bem tolerado, bem seguro, mas pode reagir e inflamar após um
estímulo imunológico, como dengue, Covid, tuberculose", afirma Miot.
O cirurgião plástico Luís Maatz reforça que os preenchedores
são seguros em mãos especializadas, mas os erros costumam ser de difícil
tratamento. "Materiais não biocompatíveis, como metacrilato ou hidrogel,
não devem ser utilizados, pois não são completamente absorvidos pelo organismo,
apresentando risco de infecção e rejeição, com chance de cronificação e
sequelas", destaca.
Maatz diz ainda que as aplicações superficiais em determinadas
áreas, como a pálpebra inferior, podem causar edema e alteração de coloração da
pele. "Caso a necrose tecidual ocorra, haverá necessidade de cuidados
locais com curativos e reconstrução com retalhos ou enxertos de pele a depender
da extensão", descreve.
O tratamento de deformidades, assimetrias e edemas, por sua
vez, varia desde massagens no local até o uso da hialuronidase injetada para
dissolver o produto aplicado.
"Há muitos médicos ou outros profissionais (como
dentistas, biomédicos, farmacêuticos, enfermeiros, fisioterapeutas) que se
intitulam especialistas em estética, mas não possuem formação para realizar os
procedimentos de forma adequada e segura. Para minimizar os riscos, garanta que
seu médico seja realmente especialista e tenha experiência", indica o
cirurgião.
Para José Horacio Aboudib, membro titular da SBCP (Sociedade
Brasileira de Cirurgia Plástica) e coordenador de cirurgia plástica da Uerj
(Universidade do Estado do Rio de Janeiro), a pretensa facilidade desse tipo de
procedimento induz ao erro e põe pacientes em risco.
"Qualquer procedimento médico deve ser feito, por mais
simples que possa parecer, por um especialista no assunto", diz.
Para escolher um profissional, a recomendação é buscar informações nos sites da SBCP e da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia).
A SBD-GO parabeniza os autores pelo trabalho.